O Congresso Nacional está discutindo propostas de emenda à Constituição que podem alterar profundamente a relação entre os poderes no Brasil. A principal delas é a PEC 50/2023, que autoriza deputados e senadores a anular decisões definitivas do Supremo Tribunal Federal (STF) consideradas inconstitucionais ou fora do alcance de atuação da Corte. A medida exige quórum qualificado: pelo menos 308 votos na Câmara e 49 no Senado, em dois turnos de votação. Se aprovada, a decisão do Supremo seria anulada imediatamente após a promulgação pelo presidente do Congresso, sem possibilidade de revisão pela própria Corte. Já a PEC 28/2024, apresentada posteriormente, adota um formato menos rígido, mas também polêmico. Nela, o Congresso teria o poder de suspender decisões do STF por até dois anos, com possibilidade de prorrogação pelo mesmo período. Para isso, seria necessária a aprovação por dois terços dos parlamentares em cada Casa. O texto ainda prevê que o Supremo só poderia reverter a suspensão caso quatro quintos dos seus ministros votassem pela manutenção da decisão. Além disso, a proposta limita decisões monocráticas, exigindo que liminares sejam confirmadas pelo plenário do STF.
Os defensores das medidas afirmam que o Supremo tem extrapolado seu papel, interferindo em temas que deveriam ser tratados pelo Legislativo. Decisões recentes envolvendo descriminalização do porte de drogas, regulamentação do aborto e demarcação de terras indígenas são constantemente citadas como exemplos de ativismo judicial. Para deputados e senadores favoráveis, as PECs representam uma forma de reequilibrar os poderes e devolver ao Congresso a prerrogativa de legislar sobre questões de grande impacto social. Eles argumentam que, em uma democracia representativa, cabe aos parlamentares, eleitos pelo voto popular, a palavra final em matérias de forte repercussão política.
Por outro lado, juristas, especialistas em direito constitucional e entidades da sociedade civil têm se manifestado contra as propostas. Segundo eles, dar ao Congresso o poder de anular ou suspender decisões judiciais fere a independência do Judiciário e quebra o princípio da separação de poderes, um dos pilares do Estado democrático de direito. A crítica mais recorrente é de que a mudança enfraqueceria o STF como guardião da Constituição, criando insegurança jurídica e abrindo espaço para disputas políticas dominarem o campo das decisões judiciais. Há ainda quem veja risco de retaliação: o Congresso poderia usar o mecanismo para derrubar julgamentos que contrariem interesses políticos momentâneos, minando a estabilidade institucional.
Na prática, ambas as PECs já avançaram no processo legislativo. A PEC 50 foi admitida na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em outubro de 2024 e aguarda análise em comissão especial antes de seguir para votação em plenário. A PEC 28 foi apensada à PEC 50 e também recebeu parecer favorável na CCJ em agosto de 2024. Apesar disso, a tramitação pode ser contestada judicialmente, já que especialistas entendem que essas propostas violam cláusulas pétreas da Constituição.
O debate em torno dessas PECs revela a crescente tensão entre Legislativo e Judiciário. Enquanto parlamentares falam em conter excessos do Supremo, críticos alertam para os riscos de uma crise institucional sem precedentes. O resultado dessa disputa pode redefinir os limites de atuação entre os poderes no Brasil.
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