Com a economia ainda fragilizada e o crédito cada vez mais difícil de acessar, brasileiros inadimplentes têm recorrido a soluções criativas – e muitas vezes precárias – para tentar reequilibrar a vida financeira. Uma pesquisa do Instituto Locomotiva em parceria com a QuestionPro mostra que 34% dos endividados pretendem recorrer ao trabalho informal em 2025 como principal alternativa para quitar suas dívidas. Esse número representa um aumento expressivo em relação a 2021, quando apenas 12% consideravam essa estratégia.
O levantamento ouviu 1.283 pessoas em todas as regiões do país e revela um retrato preocupante do endividamento nacional. Mais do que números, a pesquisa evidencia os impactos profundos da inadimplência na saúde emocional, na rotina familiar e até na autoestima dos brasileiros. Para muitos, as dívidas são consequência de imprevistos, perda de emprego ou renda instável, e não simplesmente de má gestão financeira.
Atualmente, 60% da população já viveu algum episódio de inadimplência, o que representa cerca de 97 milhões de pessoas. Entre os inadimplentes atuais, 42% enfrentam essa situação pela primeira vez, enquanto os demais já acumularam experiências anteriores com contas em atraso. Quase metade desse grupo, 46%, tem dívidas vencidas há mais de um ano.
O cenário, no entanto, não é completamente desanimador. A pesquisa indica um aumento no otimismo entre os endividados. Em 2025, 74% acreditam que conseguirão quitar suas dívidas, contra 62% em 2023. A expectativa de sair do vermelho em até um ano é compartilhada por 62% dos entrevistados, especialmente entre os jovens de 18 a 29 anos, onde o índice chega a 72%.
Além dos trabalhos informais, outras estratégias adotadas pelos inadimplentes incluem renegociação das dívidas (88%), cortes de gastos (33%), horas extras (19%) e até mesmo a venda de bens pessoais. Há ainda quem busque soluções mais arriscadas, como o uso de apostas esportivas.
A principal origem das dívidas ainda é o cartão de crédito e as financeiras, responsáveis por 43% dos casos. Em seguida, aparecem contas de celular (23%), uso do cheque especial (20%) e contas básicas como água, luz e gás (17%).
O estudo também aponta que 91% dos inadimplentes identificam a necessidade de acesso a crédito mais barato e 90% desejam mais informação sobre educação financeira. Outras demandas incluem ferramentas de gerenciamento de dívidas, oportunidades de emprego, capacitação profissional e apoio ao empreendedorismo.
A inadimplência também reflete as desigualdades sociais no Brasil. A maioria dos devedores pertence à classe C (61%), tem entre 30 e 49 anos (41%), é composta por mulheres (52%) e pessoas negras (59%). Mais da metade (54%) possui apenas o ensino fundamental completo.
Por fim, a pesquisa destaca a importância dos serviços públicos no enfrentamento da inadimplência. Assistência social, apoio psicológico e creches com maior acessibilidade foram apontados como elementos que podem aliviar a carga emocional e financeira das famílias.
Para os entrevistados, mais do que contas atrasadas, a dívida representa uma experiência dolorosa e persistente, que impacta o trabalho, a saúde e as relações familiares. O combate à inadimplência, portanto, passa por mais do que esforço individual — exige justiça econômica e oportunidades concretas de recomeço.
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