Retaliação ao tarifaço de Trump pode ter efeito limitado e custar caro para setores-chave, aponta estudo
Entidades que representam setores exportadores brasileiros, além de bancos, corretoras e consultorias, intensificaram nas últimas semanas as estimativas para medir o impacto que uma tarifa linear de 50% sobre as vendas do Brasil para os Estados Unidos pode ter sobre os negócios do país. Entre as projeções, chama atenção a análise do Banco Inter, que foi além do impacto direto e calculou o que ocorreria se o Brasil decidisse responder na mesma moeda, elevando tarifas de importação de produtos norte-americanos em igual magnitude.
Segundo estudo assinado por André Valério e Gustavo Menezes, da equipe de Macro Research do Inter, uma retaliação simétrica — ou seja, o Brasil aplicar um aumento de 50 pontos percentuais nos tributos de importação de bens vindos da economia americana — geraria um “choque tributário” equivalente a 0,17 ponto percentual do PIB brasileiro. O cálculo considera apenas o impacto adicional, sem contar as perdas que o tarifaço de Trump já traria diretamente às exportações.
Embora o efeito macro pareça contido, os especialistas destacam que a medida esconderia uma forte dispersão de impactos entre os setores. Dos 66 segmentos avaliados, 56 teriam prejuízos. Um dos mais afetados seria a indústria química, que poderia ver sua produção recuar 6,6 pontos percentuais. A indústria de transformação como um todo sofreria queda estimada em 2,1 pontos percentuais no valor agregado.
A razão para o efeito pulverizado é clara: a indústria brasileira ainda depende fortemente de insumos intermediários vindos do exterior — e uma parcela relevante deles é importada dos Estados Unidos. “Tarifar essas importações pode gerar um efeito cascata em vários setores, particularmente na indústria, que é altamente dependente de insumos intermediários”, alerta o relatório.
Um exemplo emblemático é o carvão mineral, que sofreria um aumento de imposto efetivo de 18,8 pontos percentuais com a retaliação. Outros produtos químicos e bens de capital também ficariam mais caros, encarecendo a produção e pressionando os preços internos. A consequência imediata seria o aumento de custos para as cadeias produtivas, com impacto negativo na competitividade da indústria nacional.
Por outro lado, os poucos setores que poderiam se beneficiar da retaliação seriam principalmente ligados a serviços que dependem menos de insumos industriais. Mesmo assim, os ganhos seriam residuais e decorrentes apenas da mudança de preços relativos, que levaria o consumidor a substituir parte do consumo de importados por produtos nacionais.
Para chegar aos resultados, o Banco Inter utilizou um modelo econômico capaz de capturar efeitos de segunda ordem — os chamados efeitos de equilíbrio geral — que buscam mapear as interações entre os diferentes setores da economia. A conclusão do estudo reforça a percepção de que medidas tarifárias, além de distorcerem preços, geram ineficiências e acabam provocando mais danos do que benefícios no longo prazo.
Economistas ouvidos pelo banco defendem que, em vez de aumentar tarifas, o Brasil deveria buscar justamente o caminho oposto: ampliar sua integração ao comércio global, reduzindo barreiras tarifárias e fortalecendo acordos bilaterais e multilaterais. Na avaliação do Inter, essa seria a melhor forma de suavizar choques externos como o imposto extra anunciado por Trump.
O impasse segue, no entanto, com poucos sinais de solução a curto prazo. Enquanto a diplomacia brasileira tenta abrir canais de diálogo com Washington, analistas alertam que, caso a retaliação se confirme, os custos indiretos podem ser ainda maiores que o choque direto do tarifaço.
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